As novas demandas da terceira idade

Cristiane de Paula Felipe

Em um de seus mais belos textos Paulo Leminski conclui que a vida hoje é crônica. Afora a gota de ironia implícita nesta avaliação, os versos do poeta traduzem a intensidade, o vigor e a duração da vida nos dias de hoje: a longevidade (vale lembrar que a palavra crônica deriva de chronicus, relativo a tempo). Com os avanços da ciência e as melhoras das condições de higiene, saúde e inserção econômica, viver ficou mais demorado.

Na última década, a expectativa de vida no Brasil saltou de 75 para 81 anos e projeções do IBGE apontam uma população idosa três vezes maior no país daqui a duas décadas. Hoje, já contamos com 24 milhões de consumidores com mais de 60 anos. Isso representa 13% da população adulta, que movimenta mais de 400 bilhões de reais anualmente,  de acordo com o instituto Data Popular.

Diante desse quadro, uma gama de possibilidades de negócios voltados para atender a esse público específico vem se abrindo de forma vertiginosa. Vale ressaltar que ainda há poucos serviços e produtos adequados para essa parte da população. Em parte, tal deficiência é devida à falta de conhecimento sobre o perfil desse contingente. O idoso de hoje é muito diferente daquele homem velho de alguns anos atrás.

Para começo de conversa, ninguém mais é velho com sessenta ou setenta anos – muitos até continuam plenamente jovens até com mais anos que isso. São pessoas ativas, tanto física quanto intelectualmente, muitos envolvidos em atividades esportivas de fazer inveja a vários adolescentes, ou produzindo ininterruptamente, a todo vapor. Os exemplos de Oscar Niemyer e de Tomie Ohtake são emblemáticos. Estando acima dos cem anos, continuaram trabalhando com extrema criatividade.

Em minha área de atuação, a gestão de espaços voltados para o acolhimento e convívio de pessoas na terceira idade, um dos desafios encontrados está na preparação e formação de uma equipe coesa e adaptada ao novo perfil dessa clientela. Acostumados a tratar aqueles que envelhecem com certo tom de comiseração, muitas vezes concebendo a velhice como uma doença, parte desses profissionais pouco contribui para a saúde daqueles que estão sob seus cuidados.

Partindo do pressuposto de que o envelhecimento pode e deve ser saudável, tenho buscado aplicar em meu trabalho o conceito do envelhecimento ativo. Por esta concepção, uma boa interação das saúdes física e mental, integrada a um bom convívio social e familiar, além da independência econômica e de locomoção para a vida prática, são os pilares para um envelhecimento com plenitude de vida. Pessoas precisam se sentir sadias e ativas enquanto envelhecem. O envelhecimento deve ser visto, portanto, como um prolongamento da vida útil. Esta ideia também deve ser o norte para mudanças de atitudes em nossas formas de vida, seja em qual idade estivermos.

A prática de atividade física de forma regular, o acesso à cultura, a preocupação com a espiritualidade, além do monitoramento médico frequente, são alguns dos fatores que contribuem para a melhoria da qualidade de vida e, consequentemente, para um envelhecimento mais saudável.

Deixar de ver o envelhecimento com uma conotação negativa é um grande desafio em um mundo voltado para o novo, que estabelece padrões quase obrigatórios de beleza e comportamento nos quais tudo deva parecer jovem e exuberante. Em parte, esse bombardeio publicitário contribui para a formação do preconceito em relação à velhice. E não deveria ser assim, já que envelhecer é parte inexorável da condição humana: envelhecemos desde o nosso primeiro choro na maternidade. Portanto, entender o processo de envelhecimento é a melhor maneira para convivermos e aceitarmos esse aspecto natural da vida.

Entender o perfil deste “novo” público, suas necessidades, suas especificidades e diversidade é um desafio ao qual todos aqueles envolvidos com esta clientela estão convocados. Mudar o paradigma em relação à velhice é o primeiro passo rumo a esse entendimento. E essa mudança deve ser urgente, afinal, a vida hoje é crônica.